Não consegui chegar à nada, nem mesmo a tornar-me mau: nem bom nem canalha nem honrado nem herói nem inseto. Agora, vou vivendo meus dias em meu canto, incitando-me a mim mesmo com o consolo raivoso — que para nada serve — de que um homem inteligente não pode, a sério, tornar-se algo, e de somente os imbecis o conseguem. Sim, um homem inteligente do século dezenove precisa e está moralmente obrigado a ser uma criatura eminentemente sem caráter; e uma pessoa de caráter, de ação, deve ser sobretudo, limitada.
Esta é a convicção dos meus quarenta anos. Estou agora com quarenta anos; e quarenta anos são, na realidade, a vida toda; de fato, isso constitui a mais avançada velhice. Viver além dos quarenta é indecente, vulgar, imoral! Quem é que vive além dos quarenta? Respondei-me sincera e honestamente. Vou dizer-vos: os imbecis e os canalhas. Vou dizer isto na cara de todos esses anciãos respeitáveis e perfumados, de cabelos argênteos! Vou dizê-lo na cara de todo mundo! Tenho direito de falar assim, porque eu mesmo hei de viver até os sessenta! Até os setenta! Até os oitenta! ... Um momento! Deixai-me tomar fôlego...
— Fiódor Dostoiévski, in Memórias do Subsolo – página 17, capítulo 01.
Obra de Edvard Munch.
Fonte: Literatus
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