Exposição com roupas de vítimas de estupro refuta tese de culpa da mulher

RIO — Um pijama, um vestido infantil e um conjunto de blusa e saia. Essas peças fazem parte da exposição “O que você estava vestindo?”, aberta na semana passada no Centro Comunitário Marítimo no distrito de Molenbeek, em Bruxelas, na Bélgica. A mostra apresenta ao público as roupas que vítimas de estupro usavam quando foram atacadas, desconstruindo a noção vigente de que o vestuário pode justificar a violência sexual.

Exposição mostra que roupa não justifica estupros Foto: Centro Comunitário Marítimo.

— Eu realmente espero que as pessoas mudem suas visões sobre as vítimas — comentou Delphine Goossens, gerente de projetos do serviço de prevenção de Molenbeek. — O estupro não é sobre sexo, de um cara que não consegue controlar os seus desejos. É sobre poder.

Em muitos casos de estupro, as vítimas são questionadas sobre as roupas que vestiam no momento da agressão sexual, com base no mito de responsabilização da vítima. De que ela seria, em parte, culpada por ter sido estuprada. Em muitos países, existe uma ideia presente na sociedade de que um vestuário considerado provocativo justificaria ataques sexuais.

A exposição reúne 18 conjuntos doados à ONG CAW East Brabant, de apoio às vítimas de violência sexual. Ao lado de cada roupa está um papel, com uma pequena resposta à pergunta: “O que você estava vestindo?”.


— À primeira vista, o público fica chocado, porque a exposição é muito visual. Num segundo momento, os visitantes se identificam com as histórias, o que torna o impacto ainda mais forte — contou Delphine.

“SÓ HÁ UM RESPONSÁVEL: O ESTUPRADOR”

Segundo Liesbeth Kennis, da CAW East Brabant, o objetivo da exposição é desconstruir o mito de que o estupro pode ser justificado em certas circunstâncias, como quando a vítima está vestindo roupas provocativas ou sob efeito de álcool ou drogas.

— O que você nota imediatamente é que são itens normais que qualquer pessoa vestiria, não roupas de látex. Existe até uma camiseta infantil do “My Little Pony”. Esta também é uma dura realidade: a maioria das vítimas de estupro lembra exatamente o que estava vestindo — apontou Liesbeth, à VRT Radio 1. — Algumas vítimas começam a pensar que elas são em parte responsáveis pelo que aconteceu como resultado do que estavam vestindo ou de como se comportavam. Mas só há uma pessoa responsável, uma pessoa que pode prevenir o estupro: o próprio estuprador.


E a questão não se restringe à Bélgica. No Brasil, por exemplo, um relatório publicado em dezembro de 2016 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela que 30% dos brasileiros concordam que “a mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada”, e 37% acreditam que “mulheres que se dão ao respeito não são estupradas”.

— É um problema mundial. Nós ouvimos muito sobre a roupa das mulheres, que o vestuário dá a entender que querem fazer sexo — disse Delphine. — Espero que a exposição mude a forma como as pessoas pensam sobre o assunto e como conversam com as vítimas.

Fonte: O Globo

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