Stalingrado: a batalha que marcou o início da derrocada nazista


Saiba como a Alemanha de Hitler capitulou após confronto épico com soviéticos.


Setembro de 1942: a soma das conquistas de Hitler era cada vez mais assustadora. Quando não dominava diretamente os territórios europeus, o nazi-fascismo contava com a colaboração de regimes amigos pré-existente ou fantoches impostos por Berlim: França, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Áustria, Hungria, Tchecoslováquia, Polônia, os Bálcãs, a Grécia e outros estavam abertos às divisões Panzer. A Wehrmacht hitlerista controlava desde a Noruega, no Oceano Ártico, até o Egito, no norte da África. O Mar Mediterrâneo convertera-se numa espécie de lago do Eixo, dominado de Oeste (Espanha) a Leste (Turquia e as proximidades da foz do Nilo) pelas forças navais da Alemanha nazista e da Itália fascista. 

No Atlântico, os submarinos alemães afundavam 700 mil toneladas por mês de barcos britânicos e norte-americanos, enquanto as tropas nazistas do 6º Exército do marechal Friedrich von Paulus rumavam a Moscou. Já haviam chegado ao Volga, exatamente ao norte de Stalingrado, em 23 de agosto. Dois dias antes, a suástica fora hasteada a 5.642 metros de altitute, no monte Elbruz, no Cáucaso. Os campos petrolíferos de Maikop, que produziam anualmente 2,5 milhões de toneladas de petróleo, haviam sido conquistados em 8 de agosto.


Soldado soviético agita bandeira na praça central de Stalingrado, em 1943

Com 600 mil habitantes, a cidade de Stalingrado concentrava boa parte da produção bélica da União Soviética. Suas fábricas destacavam-se, sobretudo, pelos blindados. Nomeada em homenagem ao Joseph Stalin, convertera-se num símbolo do poderio militar e industrial da União Soviética. Ou seja: tomá-la significava, para os nazistas, não apenas controlar a entrada para os campos petrolíferos caucasianos, mas, também, atingir moralmente o inimigo do Leste.

Inicialmente dividida em quatro fronts de batalha, a defesa soviética dispunha de 1.715.000 homens, 2.300 blindados, 16.500 canhões e 758 aviões. Do lado alemão, Hitler mobilizou para o ataque o 6º Exército: apenas sob o comando do general von Paulus, mais de 270 mil homens.

O primeiro tiro

Em 28 de junho de 1942, as tropas alemãs desencadeiam a ofensiva contra Stalingrado. A fim de atrasar o ataque, os russos provocaram incêndios nas florestas e destruíram as barragens, aplicando a tática de “terra arrasada”. Todavia, em 12 de julho, parcela das tropas alemãs atingiria os arredores da cidade. A partir de 13 de julho, uma parte da população foi evacuada, além de terem sido formados os grupos de guerrilheiros.

Em 17 de julho, os 57º e 58º exércitos soviéticos foram atacados pelo 6º exército de von Paulus. Stalin envia novas divisões comandadas por dois de seus melhores generais, Ieremenko e Vassilievsky.

Em 23 de julho, as tropas alemãs recebem a ordem de atacar o coração da cidade. Os bombardeios maciços dos alemães da Wehrmacht destroem as ferrovias que traziam os trens de abastecimento. Em agosto, o 6º Exército alemão e o 4º Exército Blindado lançam uma ofensiva contra Stalingrado, defendida pelo general Tchuikov. Em 5 de setembro, as divisões de Paulus entram nos arredores da cidade quando então são travados os primeiros combates de rua.

Os alemães reduziram a cidade a escombros. Os soviéticos, em contrapartida, tornaram-se especialistas em montar emboscadas, permitindo alvejar os soldados germânicos a curta distância. Por outro lado, pontilharam a cidade de ‘snaypersky’ – atiradores de elite – que semeavam o terror entre os soldados inimigos que temiam ser mortos até em suas tendas de campanha.


Atiradores de elite das forças soviéticas defendem posição em Stalingrado

Dia após dia, o cerco se apertava e em fins de novembro a zona urbana era invadida. Veio a ordem terminante: defender a todo custo as fábricas Outubro Vermelho e Barricadas que produziam os carros de assalto, a Fábrica de Tratores que construía os blindados T-34 e a estação ferroviária central onde as matérias primas eram desembarcadas.

A batalha histórica

Iniciou-se então a mais feroz, a mais encarniçada, a mais renhida e sangrenta, a mais dramática das batalhas militares que a História da humanidade conheceu. O terreno coberto de destroços impedia qualquer ação de blindados, a proximidade dos contendores tornava impraticável a cobertura aérea. Só restava calar baionetas e passar a travar a luta casa a casa, corpo a corpo, em cada centímetro de chão.

Para ilustrar a tenacidade com que se combatia, basta lembrar que a plataforma semidestruída da estação de trens mudou de mãos sete vezes num único dia. Os operários da Outubro Vermelho empunharam armas e estabeleceram uma muralha de fogo em torno da fábrica. Jamais se havia visto tantas cenas de heroísmo, bravura e coragem, de lado a lado, naquele cenário lúgubre das ruínas da cidade.

Em 21 de setembro, 4 divisões de infantaria e 100 tanques alemães atravessam a cidade e atingem o rio Volga cinco dias depois. Em 5 de outubro, os soviéticos enviam 200 mil soldados a Stalingrado, entre os quais uma divisão de elite de cossacos. Em 15 de outubro, os alemães tomam a fábrica Barricadas e uma longa faixa às margens do rio. Na semana seguinte, ocupam a parte sul da fábrica Outubro Vermelho e uma outra faixa do rio. Neste ponto, o 62º Exército soviético se encontrava então dividido em três pedaços e a comunicação entre eles tornou-se extremamente difícil.

Chega o inverno

Em meados de novembro caem as primeiras nevascas. No final do mês, a maior parte da cidade estava em mãos germânicas e os russos se encontravam encurralados entre os canhões alemães e as águas geladas do Volga. Malgrado enormes perdas, os russos conseguem conter o avanço a tempo de chegarem os reforços — novas divisões, carros blindados e artilharia. Nessa altura, a Wehrmacht dominava amplamente o rio Volga.

Em 12 de novembro, as tropas romenas encarregadas de proteger a rota dos caminhões alemães de apoio logístico foram atacadas pelo Exército Vermelho, que as obrigou a bater em retirada. Os 200 mil homens de Paulus estavam seriamente ameaçados de não receber provisões. O jovem general Rokossovsky, cumprindo orientações de Zhukov organiza uma contra-ofensiva em pinça a fim de cercar os germânicos, operação batizada de Uranus. Desencadeada em 19 de novembro, o Exército Vermelho empregaria 15 exércitos em três fronts diferentes.

Rokossovsky logra romper em Kremenskaia, a noroeste de Stalingrado, as linhas alemãs. No dia seguinte, Ieremenko atravessa o Volga a 10 quilômetros ao sul da cidade. O contra-ataque do 4º exército blindado alemão é repelido em Kalatch. O 4º exército romeno — o ponto fraco da linha alemã — é cercado por Ieremenko. Antes divididos, os fronts soviéticos se juntam novamente em 23 de novembro. Ao completar a operação, o Exército Vermelho acabava de cercar o 6º Exército de Paulus e uma parte do 4º Exército de ‘Panzers’, ou seja, 22 divisões, num total de mais de 300 mil homens.

Nesse estágio da batalha, os alemães tinham ainda uma escapatória. O ‘reichsmarschall’ Göring anuncia que poderia lançar do ar 500 toneladas diárias de víveres e munições aos sitiados e Hitler ordena a Paulus manter-se em suas posições. Com apenas 57 mil homens e 130 tanques, Paulus sabia que era impossível cumprir a ordem. Recebe então um ‘diktat’ pessoal do Führer: “vencer sem capitular ou morrer’. Nesse mesmo dia, o marechal von Mainstein assume o comando do grupo de exércitos do Don.

Von Mainstein havia sido encarregado de socorrer as tropas cercadas de Paulus. Entrementes, a Luftwaffe fornecia apenas 300 toneladas diárias de material. De 12 a 23 de dezembro uma desesperada operação “Wintergewitter’ – Tempestade de Inverno – foi lançada tendo por objetivo romper as linhas soviéticas a sudoeste de Stalingrado, contudo foram contidos a 55 quilômetros do enclave. De 24 a 30 de dezembro, teve lugar um contra-ataque soviético contra um grupo de exércitos do general Hoth. Durante o mês de janeiro, Stalingrado, a mãe de todas as batalhas, era quase que totalmente retomada pelo Exército Vermelho.

Uma ofensiva lançada pelos russos obriga von Manstein a bater em retirada e abandonar a tentativa de livrar o 6º Exército de von Paulus. Mais ainda, teve de se retirar do Cáucaso após sofrer pesadas baixas. Nessa altura, a Luftwaffe só podia lançar de paraquedas entre 20 e 50 toneladas de material e de víveres por dia. Os soldados não tinham mais vestimentas adaptadas para enfrentar o rigoroso inverno e congelavam sem provisão de boca nem munições. Os cavalos serviram de alimento e a ração de pão fixada em 100 gramas diárias, depois 60 gramas.

A retomada

Em 8 de janeiro de 1943, Paulus recusa um ultimato que oferecia uma capitulação honrosa. Em 24 de janeiro, após pesadíssimas perdas, muda de estado de espírito e roga a Hitler autorização para capitular, que o Führer recusa enfaticamente. Em 25 de janeiro, os alemães só detinham uma área de apenas 100 km2. Em 26, um ataque de Rokossovsky corta o 6º Exército alemão em dois. Foi então desencadeada a operação “Círculo”. Em 27 de janeiro, os soviéticos começaram a limpar os bolsões de resistência alemães, incapazes de resistir a um assalto em regra.

A Batalha de Stalingrado chegava ao fim. Os russos tomaram 60 mil veículos, 1.500 tanques e 6 mil canhões. Entre as tropas militares, 94.500 alemães foram feitos prisioneiros; dos quais 2.500 oficiais, 24 generais e o próprio marechal von Paulus. Ao todo, 140 mil alemães foram mortos, feridos ou congelados. Os soviéticos, por seu lado, perderam 200 mil homens, sem contar as vítimas civis.


[Prisioneiros de guerra alemães, capturados pelo Exército Vermelho, após o fim da longa batalha de Stalingrado, em 1943]

Em 30 de janeiro de 1943, décimo aniversário da subida de Hitler ao poder, o Führer havia feito uma solene proclamação pelo rádio: “Daqui a mil anos os alemães falarão sobre a Batalha de Stalingrado com reverência e respeito, e lembrarão que, a despeito de tudo, a vitória final da Alemanha foi ali decidida”.

Três dias depois, em 2 de fevereiro, o marechal-de campo Friedrich von Paulus assinava diante do general Tchuikov, comandante das tropas do Exército Vermelho em Stalingrado, a rendição do 6º exército alemão. Era a primeira vez que um marechal alemão capitulava e era feito prisioneiro. A transmissão da capitulação foi feita em Berlim, através da rádio alemã, pelo general Zeitzler, chefe do Alto Comando da Wehrmacht (OKW) precedida do rufar abafado de tambores e da execução do segundo movimento da Quinta Sinfonia de Beethoven. Sete meses depois, a maior e a mais épica das batalhas da 2ª Guerra Mundial que tivera início em 26 de junho havia chegado ao fim. A espinha dorsal do exército nazista e do Terceiro Reich estava irremediavelmente quebrada.

Fonte: Opera Mundi
Por Max Altman

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