Sertão. O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado! E bala é um pedacinhozinho de metal… (Grande Sertão: veredas)
Hoje é aniversário do mestre do Sertão, João Guimarães Rosa. Se estivesse vivo, o autor completaria hoje 106 anos. Natural de Cordisburgo, no sertão mineiro, Rosa nasceu no dia 27 de junho de 1908 e veio a falecer em 19 de novembro de 1967, no Rio de Janeiro.
Grande contista e romancista, os textos de Guimarães Rosa são tão potentes – utilizando a expressão de Reni Adriano – que talvez o imaginário do sertanejo que hoje concebemos tenha sido, ao menos em grande parte, criado pelas obras do autor. As invenções e intervenções semânticas e sintáticas, que abrem caminho para a inserção da fala, da cultura e das crendices populares do sertanejo, consagraram o autor no reino das letras.
A elaboração extrema da palavra, a reinvenção, os neologismos fazem de sua literatura uma aventura e um empreendimento único, inigualável. Mas o mérito de sua literatura não se resume ao trabalho com a palavra: suas personagens, radicadas quase sempre no sertão brasileiro, são a amostra da complexidade do que há de mais universal na literatura, o humano.
Foi médico e diplomata, Rosa desenvolveu durante o tempo de serviço diplomático também sua outra grande paixão, o estudo de línguas estrangeiras. Para ele, tal empreitada era mais que uma curiosidade ou simples gana de aprendizagem, era uma maneira de conhecer e entender a fundo o próprio português. Em entrevista, o autor disse:
Eu falo: português, alemão, francês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, um pouco de russo; leio: sueco, holandês, latim e grego (mas com o dicionário agarrado); entendo alguns dialetos alemães; estudei a gramática: do húngaro, do árabe, do sânscrito, do lituano, do polonês, do tupi, do hebraico, do japonês, do checo, do finlandês, do dinamarquês; bisbilhotei um pouco a respeito de outras. Mas tudo mal. E acho que estudar o espírito e o mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e distração.
Em 1963 foi nomeado para a Academia Brasileira de Letras, posse que o autor adiou por quatro anos, por conta de uma superstição de que, se assumisse, viria a morrer. Crendices à parte, curiosamente Guimarães Rosa morreu apenas três dias depois de tomar posse na agremiação. Você pode conferir um pouco mais sobre sua vida e obra através do tour virtual pelo Museu Casa Guimarães Rosa.
Sua principal e mais universal obra é, com certeza, Grande Sertão: veredas (1956), mas também há obras de grande vulto que são de sua autoria, como Sagarana (1946), Corpo de Baile(1956), Primeiras Estórias (1962) e Campo Geral (1956).
Nossa intenção neste artigo era a de compartilhar algumas obras do autor na íntegra, para que pudessem ser apreciadas, lidas, conhecidas. No entanto, há algum tempo as obras de Rosa foram retiradas do domínio público por uma polêmica envolvendo direitos autorais que, ao que parece, estão sob domínio da família do autor até 2037.
Porém ficam aqui um excelente documentário, realizado e disponibilizado gratuitamente pela TV Escola, que trata sobre a obra do autor. Para os admiradores de seus livros, fica um aprofundamento e uma viagem por suas histórias. Para quem ainda não se aventurou pelas veredas de sua literatura, deixamos um conselho:
Como é de são efeito, ajudo com meu querer acreditar. Mas nem sempre posso. O senhor saiba: eu toda a minha vida pensei por mim, forro, sou nascido diferente. Eu sou eu mesmo. Divêrjo de todo mundo… Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. O senhor concedendo, eu digo: para pensar longe, sou cão mestre – o senhor solte em minha frente uma idéia ligeira, e eu rastreio essa por fundo de todos os matos, amém! (Grande Sertão: veredas)
Guimarães Rosa: O mágico no reino das palavras
Fonte: Livre Opinião
Por Vinicius de Andrade
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