É arriscado tentar definir a ideia de erotismo à qual se dedicou o escritor francês Georges Bataille (1897-1962). Mas uma afirmação é possível fazer: o erótico a que ele se refere não está restrito ao corriqueiro sentido sexual com que o termo é usado. O ato sexual e a sexualidade são o cerne da discussão levantada por ele, mas num nível nada rasteiro. “Para Bataille, o ser humano é um ser descontínuo. Nasce só. Morre só.
O paradoxo é que se, por um lado, queremos sempre conservar essa descontinuidade (tememos a morte), por outro, sentimos falta da continuidade perdida ao nos percebermos como ‘indivíduos’ (desejamos a morte)”, escreve Fernando Scheibe, apresentando a nova edição do livro O Erotismo, traduzida e organizada por ele, a ser lançada no final deste mês pela Autêntica.
Noutro texto trazido pela reedição, Bataille explica que, por meio da revolução sexual, chegou-se à “revisão de uma moral fundada sobre a noção de pecado e de vergonha”. Na carta de 1957, ano de publicação do livro, ele diz ao sociólogo e crítico literário Roger Caillois que o erotismo é sagrado e divino, porque ambos têm, em sua base, a violência e a intensidade do erotismo. “Participam do mesmo impulso”, diz.
Daí, para o filósofo, o gozo ser uma pequena morte. “O momento do erotismo é quando você deixa de se preocupar com sua própria conservação”, explicou Fernando ao O POVO. O diálogo com a arte acontece, portanto, na liberdade que resulta da consciência, e mesmo da vivência, desse erotismo. Não à toa, quando uma obra artística promove a derrubada de barreiras, o deslocamento de zonas de conforto, a superação de proibições morais, consegue ser o que Fernando chama de “ato erótico”.
Talvez por causa dessa potência é que obras assumidamente eróticas não raro sofrem resistência do público, do mercado e, às vezes, do próprio artista. “Essa produção quer tratar dos tabus, aquilo que atinge zonas que devem ser mantidas na intimidade e no espaço do não dito”, especifica Orlando Amorim, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista). O coreógrafo cearense Fauller vem trabalhando com a Cia. Dita questões ligadas ao corpo e à nudez há dez anos. Para ele, o erotismo assusta, conforme diz Bataille, “por ser um assunto que, quando alguém detém o conhecimento sobre ele, passa a ter liberdade. E lidar com a própria sexualidade de forma livre é muito perigoso pra quem está em volta e tem medo”.
Nesse contexto é que uma obra como O Erotismo não perde relevância. Segundo a professora da Universidade de São Paulo (UPS) Eliane Robert Moraes, uma das maiores conhecedoras da obra de Bataille no Brasil e especialista em literatura erótica, que também contribuiu com a reedição, “é um livro que coloca uma questão filosófica maior”, além da “constante problematização da noção de homem e de humanidade”.
O Vida&Arte Cultura de hoje convida o leitor a passear pelo erotismo nos diversos campos da arte. Na cultura popular, que também é permeada de referências eróticas, o pesquisador Gilmar de Carvalho é quem conduz a reflexão a partir dos apitos do artesão Zé Celestino.
Serviço
O Erotismo, de Georges Bataille
(Tradução de Fernando Scheibe)
Editora: Autêntica
Páginas: 344
Lançamento previsto para final de abril
Quanto: R$ 59
Fonte: O Povo
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