Carolina Noémia Abranches de Sousa Soares nasceu a 20 de Setembro de 1926, em Lourenço Marques (hoje Maputo), Moçambique. Sem livro publicado, rumou a Lisboa. Mais tarde, mudou-se para Paris. Regressaria a Portugal, onde foi jornalista da agência noticiosa portuguesa, em Lisboa. Morreu em 4 de Dezembro de 2002, Cascais, Portugal.
O seu único livro de poemas "Sangue Negro" foi publicado em 2001 pela Associação de Escritores Moçambicanos (AEMO). A poeta que, numa espécie de postura predestinada, desembaraçando-se das normas tradicionais européias, de 1949 a 1952, escreve dezenas de poemas, estando muitos deles dispersos pela imprensa moçambicana e estrangeira. Com apenas 22 anos de idade, surgiu na senda literária moçambicana num impulso encantador, gritando o seu verbo impetuoso, objetivo e generoso, vincado (bem fundo) na alma do seu povo, da sua cultura, da sua consciência social, revelando um talento invulgar e uma coragem impressionante. Como afirma Craveirinha (2000, p.100), podemos sentir o hálito ardente da fogueira, quando lemos os versos desta escritora, o que mostra em sua literatura a evidência da moçambicanidade, ou seja, a valorização da sua nação em seus poemas. Ler Noêmia de Sousa é ler Moçambique.
Como mestiça, pois seu pai era originário de uma família luso-afro-goesa e sua mãe afro-germânica, revela ser marcada por uma profunda experiência, em grande parte por via dessa mesma circunstância de ser mestiça. A sua poesia, desde logo, se mostrou "cheia" da "certeza radiosa" de uma esperança, a esperança dos humilhados, que é sempre a da sua libertação. Toda a sua produção é marcada pela presença constante das raízes profundamente africanas, abrindo os caminhos da exaltação da Mãe-África, da glorificação dos valores africanos, do protesto e da denúncia.
:: Fonte: FREITAS, Sávio Roberto Fonsêca de.. Noemia de Sousa: poesia combate em Moçambique. In: III Seminário Nacional de Estudos Afro-Brasileiros, 2010, João Pessoa. Cadernos Imbondeiro. João Pessoa: Editora da UFPB, 2010. v. 1. p. 89-107. Disponível no link. (acessado em 8.7.2015).
Poema
Bates-me e ameaças-me
Agora que levantei minha cabeça esclarecida
E gritei: “Basta!” (…) Condenas-me à escuridão eterna
Agora que minha alma de África se iluminou
E descobriu o ludíbrio E gritei, mil vezes gritei: _Basta!”.
Armas-me grades e queres crucificar-me
Agora que rasguei a venda cor-de-rosa
E gritei: “Basta!”
Condenas-me à escuridão eterna Agora que minha
alma de África se iluminou E descobriu o ludíbrio..
E gritei, mil vezes gritei: _Basta!_
Ò carrasco de olhos tortos,
De dentes afiados de antropófago
E brutas mãos de orango:
Vem com o teu cassetete e tuas ameaças,
Fecha-me em tuas grades e crucifixa-me,
Traz teus instrumentos de tortura
E amputa-me os membros, um a um…
Esvazia-me os olhos e condena-me à escuridão eterna… –
que eu, mais do que nunca,
Dos limos da alma,
Me erguerei lúcida, bramindo contra tudo:
Basta! Basta! Basta!
- Noémia de Sousa, em "Sangue negro". Moçambique: Associação de Escritores Moçambicanos, 2001.
Fonte: Templo Cultural Delfos
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